domingo, 24 de setembro de 2006

Últimas considerações de um Mundial inesquecível

Por Adriano Albuquerque

O Mundial feminino de São Paulo chegou ao fim neste sábado com um bom jogo entre Rússia e Austrália, e uma vitória merecida das australianas. A equipe apresentou uma regularidade e eficiência impressionantes por todo o torneio e mereceu o título. Ainda mais depois daquela virada sobre o Brasil, em que mostraram força de vontade, raça e categoria.

Foi uma competição que não sairá da minha cabeça por muito tempo, e que não esquecerei jamais. Achei que a qualidade do torneio em geral foi melhor do que a do Mundial masculino do Japão, que teve alguns jogos chatos e decepcionantes, embora tenha sido interessante também. O nosso Mundial, não; foram poucos os jogos ruins, e houve muita emoção. A campanha brasileira, então, foi uma montanha russa de sensações que, infelizmente, teve um final triste, embora ainda respeitável, já que o time é um dos quatro melhores do mundo.

Tivemos uma campeã inédita, um tri-vice russo - quem vence uma final entre Rússia e Vasco? -, o fim da invencibilidade e supremacia americana, os recordes de pontos de Boulet e Valdemoro, a empolgante campanha da Argentina, as despedidas de Janeth, Helen, Alessandra e Cíntia Tuiú (pelo menos de Mundiais)... Sem esquecer da polêmica decisão da Fiba de dar um ponto e o placar de 0 a 2 para a Lituânia no W.O., o que acabou resultando nas européias roubando o lugar das argentinas nas quartas-de-final e terminando na quinta posição! Um Mundial histórico, para bem e para mal. Mas com certeza mais para bem.

***

Da Seleção Brasileira, me recordarei da garra, da força de vontade, da superação, do crescimento com o decorrer do campeonato e da torcida.

Concordo que o quarto lugar é uma posição honrosa e que a Seleção fez uma grande campanha, mas não acho que devamos ficar contentes com isso. Até me contenho para não usar a palavra orgulho, pois não sei se fico orgulhoso das meninas pelo que conquistaram ou se fico chateado pelo que deixaram de conquistar. É uma mistura de ambos.

Pense bem. Grego, Antônio Carlos Barbosa e outros certamente apontarão para o desempenho do Mundial de 2002, quando terminamos em sétimo lugar, para mostrar que evoluímos. A verdade, entretanto, é que 2002 foi uma aberração, um resultado anormal. É preciso analisar os últimos oito anos, desde que Paula deixou a Seleção, para se ter a noção de que, na verdade, o Brasil segue estacionado em quarto lugar no mundo. Segue superior à grande maioria dos times - que estão se aproximando, como evidenciado pelas atuações de Argentina e Espanha -, mas continua incapaz de superar Austrália, Rússia e Estados Unidos, tendo terminado em quarto lugar no Mundial de 1998, terceiro na Olimpíada de Sydney-2000 e quarto na de Atenas-2004.

Estou orgulhoso, porque as mulheres (chega de chamar de "meninas", porque embora seja carinhoso, isso ajuda na diminuição do espírito delas) do Brasil mostraram qualidade, bom entendimento do jogo e coragem por três quartos contra a Austrália, mas estou desapontado também, porque a impressão que se teve foi de que o time baixou a cabeça quando a Austrália passou à frente; ainda com muito tempo de jogo no último quarto, o time lutava, mas não parecia ter fé em si mesmo. Não as culpo por isso, não culpo nem mesmo o técnico Antônio Carlos Barbosa, mas isto é mais um sinal da mentalidade perdedora que parece envolver o basquete nacional neste momento. Por isso que passo a chamá-las de "mulheres", até porque elas têm idade para isso já.

Não devemos crucificar a Seleção, devemos sim ter orgulho. Mas que esta seja a última vez que temos orgulho por um quarto lugar em casa. É hora de crescer e não ter medo de vencer, não mais dar desculpas como "a Austrália veio para ganhar o título", "perdemos para uma potência". Para hoje, isto é compreensível. Para um próximo Mundial, com Iziane, Êga, Érika, Adrianinha, Micaela e outras em seus auges, não será.

***

Fiquei emocionado com a despedida de Janeth e lamentei muito que ela não possa ter se despedido dos Mundiais com mais uma medalha. Ela é um ídolo e merece todos os aplausos e condecorações.

Mas será que é necessário mesmo que ela e Helen estejam no Pan e no Pré-Olímpico? Ambas já disseram que não disputarão os Jogos de Pequim em 2008 (Helen até deixou em aberto, mas está propensa a não ir), por que não aproveitar e dar logo entrosamento ao time que irá jogar? Escalar Janeth e Helen pode ser um atraso para a formação do novo time. Sem dúvida, Janeth, Helen, Alessandra e Cíntia são excelentes e mostraram neste Mundial que ainda podem fazer a diferença no alto nível (Cíntia um pouco menos, mas pode ser apenas uma má fase dela), mas se não vão disputar a Olimpíada, melhor que cortemos logo o cordão umbilical. Repito: precisamos crescer.

***

Lamentável foi a (des)organização do Mundial de São Paulo. E o Grego ainda tem coragem de dizer que o Rio vai ser candidato ao Mundial de 2010! É provável que o Maracanazinho e o ginásio do autódromo de Jacarepaguá fiquem em melhores condições do que o Ibirapuera e o José Corrêa, mas depois desta experiência deste ano, será que a Fiba vai ter coragem de pisar aqui de novo?

Claro, se o Grego está dizendo que vai tentar, então que tente. Por que não, neste caso, tentar articular com a Fiba para que o Pan-Americano do ano que vem seja o Pré-Olímpico masculino? Ou que o torneio seja realizado logo após o Pan, no Rio? Afinal, a Venezuela está sendo descartada pelo relacionamento ruim de seu presidente, Hugo Chávez, com os Estados Unidos; o Brasil seria perfeito para ser a sede do torneio. Valorizaria o Pan, valorizaria a cidade e ainda daria uma chance muito maior à Seleção masculina de roubar uma das duas vagas olímpicas de Estados Unidos e Argentina. Se a torcida brasileira conseguiu empurrar a Seleção feminina ao quarto lugar mundial, quem dirá que não pode empurrar o Brasil de volta aos Jogos?

Agora, desculpem, mas usar como desculpa que o Ibirapuera tem 50 anos e é difícil de reestruturar é uma balela. O Superdome, ginásio de Nova Orleans que abrigou refugiados durante o furacão Katrina e teve danos imensos por causa do fenômeno natural, receberá um jogo de futebol americano novamente nesta segunda-feira, já completamente renovado. Por que lá fora eles conseguem e aqui não?

***

Hora de distribuir meus prêmios pessoais do Mundial:

MVP: Lauren Jackson (Austrália).

Revelação: Candace Parker (EUA).

Técnico: empate entre Jan Stirling (Austrália) e Eduardo Pinto (Argentina).

Seleção do campeonato: Hana Machová (República Tcheca), Penny Taylor (Austrália), Amaya Valdemoro (Espanha), Lauren Jackson (Austrália) e Alessandra (Brasil). Reservas: Kristi Harrower (Austrália), Ilona Korstin (Rússia), Iziane (Brasil), Janeth (Brasil), Candace Parker (EUA), Belinda Snell (Austrália) e Yayma Boulet (Cuba).

Seleção das beldades do campeonato: Sue Bird (EUA), Ausra Bimbaite (Lituânia), Amaya Valdemoro (Espanha), Lauren Jackson (Austrália) e Egle Sulciute (Lituânia).


Fonte: BasketBrasil

Nenhum comentário: